Brasil.
Sábado, 29 de outubro de 2022.
01:43 da manhã.
O ACIDENTE.
A PEDIDO de Mr. Snow, Pollyanna foi ao consultório do doutor Chilton pedir o nome de um remédio que ela havia esquecido... e era a primeira vez que via o interior do seu gabinete.
— É aqui a sua casa, doutor? — indagou ela, olhando cheia de curiosidade para tudo quanto havia ali.
O doutor sorriu com resignada tristeza.
— Sim, é tudo de que disponho. Como vê, não se trata de um lar... apenas de cômodos, quartos e salas.
— Eu sei. É preciso de uma mão de mulher e a presença de uma criança para fazer um lar. — e seus olhos brilharam de compreensão simpática.
O doutor admirou-se de tanta sabedoria.
— Foi Mr. Pendleton quem me disse isso. Por que o senhor não arranja uma mão de mulher e uma presença de criança, doutor Chilton? Se quiser poderá receber aqui Jimmy Bean, caso falhe a proposta que fiz a Mr. Pendleton.
O doutor sorriu, mas com certo constrangimento.
— Com que então acha Mr. Pendleton que é necessário uma mulher e a presença de uma criança para constituir um lar?! — repetiu ele, evasivamente.
— Perfeitamente. Diz que a sua casa não passa de casa... não chega a ser lar. Por que, doutor Chilton, não transforma a sua casa em lar?
— Por quê? A pergunta é difícil de responder...
— Sim, por que não arranja uma mão de mulher e um coração... oh, esqueci-me de dizer... — e o rosto da menina mudou de expressão ao influxo de uma nova ideia. — Esqueci-me de te contar que não foi Mr. Pendleton o antigo namorado da tia Polly e por isso nós não vamos mais, as duas, viver lá. Lembre-se que garanti que tinha sido ele o antigo namorado... mas errei, e tudo por causa da teima de Nancy. Espero que o senhor não o tenha contado a ninguém.
— Não o disse a ninguém, Pollyanna, sossegue.
— Fico muito contente, porque o senhor foi a única pessoa neste mundo a quem contei a história... e Mr. Pendleton achou até graça quando soube disso.
— Realmente? — perguntou o doutor, mordendo os lábios.
— Sim. Mas por que motivo, doutor, não arranja uma mão de mulher e uma presença de criança? Responda.
Houve um momento de silêncio, ao termo do qual o doutor disse gravemente:
— Não é fácil, menininha. Não é só ir arranjando, como se arranjam as coisas vendidas nos armazéns.
Pollyanna refranziu a testa.
— Pois eu acho que posso conseguir isso, as duas coisas! Quer?
— Obrigado. — respondeu o doutor, sorrindo; e acrescentou: — Tenho receio que as suas irmãs mais velhas, Pollyanna, não se mostrem tão... tão acessíveis como você supõe. Pelo menos não se mostraram, até aqui.
A menina arregalou os olhos, tomada de surpresa.
— Quer dizer, doutor Chilton, que o senhor já tentou conseguir essa mão e esse coração, como Mr. Pendleton, e não obteve?
— Basta, Pollyanna. Não pense mais nisso. Não deixe que as infelicidades alheias entrem a preocupar essa cabecinha. Volte para casa de Mr. Snow... aqui está neste papel o nome do remédio que ela quer. Há mais alguma coisa?
A menina fez que não com a cabeça.
— Mais nada, doutor. — murmurou ela em seguida, um tanto desapontada, dirigindo-se para a porta. De súbito entreparou, já com a expressão feliz de sempre.
— Em todo o caso, doutor Chilton, fico bem contente de que não tenha sido a mão da minha mãe a que o senhor quis e não obteve. Até logo.
Foi no último dia de outubro que o acidente ocorreu. Pollyanna, ao voltar da escola, viu-se atropelada por um automóvel no momento em que atravessava a rua.
Ninguém pôde saber ao certo como se deu o desastre. Mas às cinco horas, desacordada em seu quartinho, a menina ia sendo despida por Miss Polly, horrivelmente pálida, e por Nancy, em lágrimas, enquanto, chamado pelo telefone, o doutor Warren vinha da cidade à toda.
— Nem precisava olhar para a cara de Miss Polly, — dizia logo depois a moça a Mr. Tom no jardim (o médico já havia chegado e examinava a menina.) — para ver que não era mais o tal dever que a governava. Os olhos de uma pessoa não olham daquele jeito, nem as mãos ficam tão firmes, como para barrar a entrada do "anjo da morte", quando essa pessoa está agindo apenas pelo dever. Não, Mr. Tom, não e não!
— Ficou muito maltratada? — perguntou o velho, com voz trêmula.
— Não se pode saber. — soluçou Nancy. — Está sem sentidos e tão branquinha que não há de dizer se vive ou se morreu. Só o doutor. Miss Polly diz que está viva... e há de saber, porque esteve uma porção de tempo com o ouvido no peitinho dela, escutando o coração.
— Não sabe o que o médico está fazendo?
— Qualquer coisa boa e forte... eles conhecem. Malvados! Pensar que atropelaram a nossa menina! Eu sempre tive ódio dessas máquinas fedorentas de gasolina que andam feito loucas pelas ruas... sempre, sempre.
— Em que parte do corpo está ferida?
— Não sei, não sei. — gemeu Nancy. — Há um pequeno corte naquela abençoada cabecinha, mas não muito grave, diz Miss Polly. Miss Polly tem medo que ela esteja ferida infernalmente.
— Creio que você quer dizer "internamente", Nancy. Ela foi na realidade infernalmente ferida... malditos sejam os automóveis! Mas suponho que Miss Polly não usou dessa expressão.
— É? Não sei, não sei. — gemeu Nancy, de novo, meneando a cabeça. — Parece que eu nem posso suportar a espera do doutor... digo, que ele saia do quarto, feito um juiz, com a sentença. Só queria ter hoje muita roupa para lavar, um montão enorme, para cansar o corpo e esquecer. — murmurou a moça entre soluços, retorcendo as mãos.
Mesmo depois do médico sair Nancy pouco pôde adiantar nas informações que dava ao velho Tom. Parecia não haver ossos quebrados e o corte da cabeça era de pouca importância... mas a cara do doutor não denunciava nada de bom. Saiu balançando a cabeça e dizendo que só o tempo é que poderia dar opinião no assunto. Depois que se retirou, Miss Polly mostrava um rosto ainda mais pálido e apreensivo do que antes. A menina ainda não recobrara os sentidos, embora parecesse em repouso calmo. Uma enfermeira diplomada fora pedida e chegara à noitinha. Era tudo que Nancy sabia.
Foi na manhã do dia seguinte que Pollyanna abriu os olhos e compreendeu o que se passara.
— Então, tia Polly, que há? — havia perguntado. — Parece dia velho! Oh, tia Polly! Não posso levantar-me, nem mexer-me. — gemeu ela, na primeira tentativa que fez para sentar-se.
— Não, minha cara, não experimente mover-se, por enquanto. — respondeu a tia.
— Mas que aconteceu? Por que não posso levantar-me?
Os olhos de Miss Polly ergueram-se agoniados para a moça que estava junto à janela, fora do alcance dos olhos da menina. A enfermeira disse com a cabeça que sim... que podia contar tudo.
Miss Polly pigarreou para limpar a garganta e vencer o nó que lhe embaraçava a voz.
— Você foi ferida, minha cara, por um automóvel, na tarde de ontem. Mas não se aflija com isso agora. Sua tia quer que você descanse e durma de novo.
— Ferida? Oh, sim, agora me lembro que corri... — e os olhos de Pollyanna encheram-se de pavor; sua mão foi ter à testa e fê-la dizer: — Aqui! Estou ferida aqui na testa...
— Sim, querida, mas não é nada. Descanse... durma, que fará bem.
— Mas, tia Polly, estou me sentindo tão... tão esquisita e tão mal! Minhas pernas estão... esquisitas... parecem que não sentem nada...!
Com um olhar implorativo para a ajudante, Miss Polly ergueu-se e foi para a janela. A enfermeira veio ocupar o seu lugar.
— Vai conversar comigo, sim? — começou a moça, dando inflexão de alegria à voz. — Já é tempo de nos tornarmos conhecidas e vou apresentar-me. Sou Miss Hunt, e vim ajudar a sua tia a tratar da menina. E a primeira coisa que tenho a pedir é que engula estas pequenas pílulas brancas.
Os olhos de Pollyanna dilataram-se.
Da janela onde estava Miss Polly veio um gemido abafado.
— Amanhã? — sorriu a enfermeira. — Ainda não, minha menina. Creio que não devo deixá-la ir tão cedo à escola. Mas tome estas pílulas para ver o que elas fazem.
— Pois sim, — concordou Pollyanna. — mas eu tenho que ir à escola depois de amanhã... para os exames, a senhora sabe.
Mais tarde a doentinha falou de novo. Falou da escola, do automóvel e da dor que sentia na cabeça... mas breve sua voz esmoreceu sob a influência sedativa das pílulas. 🐸
Esse foi o 23° capítulo!
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